Ex-Secretário Municipal de Cultura de Jequié, Bené Sena, fala sobre fechamento da Biblioteca Municipal entre outros assuntos. Clique e saiba mais.

02/06/2021

JN: Bené, recentemente você gravou um vídeo em frente a Biblioteca Municipal de Jequié consternado com o fechamento da mesma. Logo depois a Prefeitura Municipal publicou uma nota informando que ela não foi fechada. O que você acredita que aconteceu nessa história toda?

Bené: Em setembro de 2008, o então Prefeito Reinaldo Pinheiro, prestando conta da missão que lhe fora confiada entregava ao povo a Biblioteca Central, uma usina para o saber com o arcabouço construído pela então Secretaria de Educação e Cultura Prof. Maria das Graças Bispo com a sua equipe e o auxílio luxuoso dos técnicos da Fundação Miguel Calmon. Naquele gigantesco imóvel seria incorporado o Arquivo Público Municipal sintetizando assim um verdadeiro patrimônio, lançando no momento a semente da posteridade e usina dos sonhos que não envelhecem. Entretanto, em treze anos e alguns meses, um certo descaso dos governantes a transformaram gradativamente num pré escombro - prefeitos principalmente -, mesmo diante dos ofícios e pedidos dos secretários como no meu caso, o de Robério Chaves, de Irailton Santos e de Alysson Andrade. Esse último convenceu o prefeito Sergio Suzart que fizesse a transferência da gestão e serviços da mesma para a Secretaria de Educação que tem projetos, programas e principalmente recursos da União e Estado exequíveis para requalificação do espaço que foi feito em 15 de maio de 2018 (Lei Municipal 2.050/2018). Agora, oriundo de Três Morros surge o carrasco, o algoz, que declarou de alto e bom som vender o imóvel. Numa canetada transfere os funcionários, deixando a mercê das traças e fungos, um acervo de 20 a 25 mil livros e documentos importantes e permite que uma nota pública convença o contribuinte que uma simples limpeza periódica salve o acervo. Emiti carta para a imprensa, para Comissão de Educação e Cultura (sem nenhuma resposta) expus a minha  indignação.

 

JN: Como músico e ex-secretário Municipal de Cultura além de ser uma pessoa atuante no contexto cultural da cidade, como você enxerga a atuação da Secretaria Municipal de Cultura  nesse primeiro semestre de governo, levando em conta nosso cenário de pandemia?

Bené: É de conhecimento público que a cultura foi devastada pela pandemia a partir de março de 2020, sem contar com a caneta ou espada de um certo tenente que virou capitão e que entre outras coisas está destruindo a Cinemateca o maior acervo do Brasil na área. Para amenizar os efeitos desse desastre o município pôde contar com os recursos da Lei Federal Aldir Blanc da ordem de mais de um milhão de Reais, sendo um dos primeiros municípios brasileiros a receber recursos, fruto de um trabalho técnico, incansável da equipe do órgão liderado pelo ex-secretario Alysson Andrade. É importante que se diga para fazer justiça. Atualmente a Secretaria de Cultura vem apenas acompanhando a execução dos projetos que foram selecionados e pagos em 2020 com esses recursos da Aldir Blanc. Temos a esperança que o novo secretário Domingos Ailton,  que tem uma longa trajetória de ativista ambiental e cultural, implemente uma renda emergencial, com recursos próprios do município. O discurso de terra arrasada do prefeito e os seus técnicos não atentaram para o que qualquer gerente administrativo, contador perceberiam: quem materializou mais de um milhão de recursos para os cofres municipais em 2020 com repasse garantido para os artistas e consequentemente o comércio. O bom senso se prevalecesse tomaria esse caminho, mas no meio do caminho tem a política. Considero Domingos Ailton capaz, direito, mas eu Benedito, se fosse o prefeito (lembrei de Raul Seixas) manteria o secretário anterior.

 

JN: A Prefeitura de Jequié pretende realizar um São João virtual para garantir a renda aos trabalhadores da Cultura. Na sua opinião é uma boa saída nessa situação?

Bené: Vários municípios estão querendo fazer isso. A iniciativa é boa já que o São João virtual no momento é a única maneira possível além de possibilitar renda a alguns trabalhadores da cultura. E importante garantir a participação efetivamente democrática, dando total lisura ao processo de contratação porque Jequié tem muitos grupos e artistas ligados a linguagem junina,  alguns já consagrados e que fazem um trabalho de qualidade e beleza. Em 2020, apesar do São João virtual ter sido elaborado, já em fevereiro o projeto presencial já estava montado. Houve uma Recomendação do Ministério Público para que os municípios não realizassem a festa, não sei se a mesma recomendação se aplica agora. Penso que é preciso garantir uma política de transparência de renda que cubra todo o período pandêmico e de abraçar toda a cadeia cultural. Estamos em crise sanitária e fiscal, um São João mesmo virtual precisa de recursos extras que poderiam ser poupados, distribuído com parcimônia e durabilidade. Vocês ficarão chateados com o que direi... Quem aguenta Festa Junina Virtual? Deus me livre!

 

JN:  A arte é sempre luz na escuridão. Como você acredita que ela pode nos ajudar diante de tudo que estamos vivendo nesse momento de pandemia?

Bené: "A arte existe porque a vida por si só não basta". A vida por si só é a labuta dura para sobreviver, as perdas agora com a pandemia próxima de nós. A vida por si só é ver como representante maior do Brasil um homem que tem como ídolo um torturador de mão cheia, um homofóbico e que tem o apoio pessoas cristãs. Precisamos da arte para compreender, sonhar, rir, amar, viver. A vida por si só não basta. Acho que foi Ferreira Gullar que disse isso. Eu também acho.